Sociedade civil católica, destinada à difusão da Cultura Ocidental e à atuação política em defesa da família, em observância à Doutrina Social da Igreja.

Carta Encíclica “Divinum Illud Munus”

Afresco na Igreja do Espírito Santo, Bergamo, de Bergognone (séc. XVI).

Sobre a presença e virtude admirável do Espírito Santo

Carta Encíclica do Sumo Pontífice Leão XIII



CARTA ENCÍCLICA

Aos nossos veneráveis irmãos Patriarcas, Primazes, Arcebispos, Bispos e outros ordinários locais em paz e comunhão com a Sé Apostólica.

Veneráveis Irmãos:

Saudação e Benção Apostólica.


I. INTRODUÇÃO

1. A missão divina que Jesus Cristo recebeu do Pai e cumpriu com toda a fidelidade para o bem do gênero humano teve por finalidade remota a beatitude dos homens na glória eterna; e, por finalidade próxima, a conservação da vida da graça divina, que desabrochará um dia nos encantos da vida celeste.

É essa a razão do convite incessante e carinhoso do nosso Redentor a todos os homens, sem exceção, de todas as nações e de todas as línguas, para que se incorporem à sua Igreja: “Vinde todos a mim, Eu sou a Vida. Eu sou o bom Pastor”. Por motivos para nós impenetráveis, não quis ele, todavia, completar pessoalmente esta obra sobre a terra. Delegou, por sua vez, ao Espírito Santo, a realização definitiva da incumbência recebida do Pai. São doces de recordar as palavras de Cristo aos discípulos que o rodeavam, pouco antes de ele partir deste mundo: “Convém a vós que eu vá! Porque, se eu não for, o Paráclito não virá a vós; mas, se eu for, vo-lo enviarei” (Jo 16, 7).

Com essa afirmação, designou, como principal motivo de sua partida e regresso ao Pai, as vantagens iniludíveis que seus discípulos teriam com a vinda do Espírito Santo. Deu-nos a entender, ao mesmo tempo, que o Espírito Santo seria enviado por Ele próprio e pelo Pai, pois de ambos procede, e que terminaria, como Advogado, Consolador e Mestre, a obra que ele, o Filho, efetuara em sua vida mortal. Com efeito, a múltipla virtude desse Espírito, que, na criação do mundo, “adornou os céus” (Jó 26,13) e “encheu o universo” (Sb 1,7), estava reservada, por singular providência, a coroação da obra da redenção.

A. Os dois principais objetivos do nosso pontificado

2. Temo-nos esforçado, sem cessar, com a ajuda de Cristo Salvador, príncipe dos pastores e guarda de nossas almas, em imitar-lhe o exemplo em nossa total dedicação ao seu ministério, confiado aos apóstolos e particularmente a são Pedro, “cuja dignidade não falta em seu, embora indigno, herdeiro” [1]. Nesse sentido, visamos de modo especial a duas finalidades, neste nosso pontificado, que já se vai prolongando muito: primeiro, a restauração da vida cristã na sociedade e na família, nos postos governamentais e no meio do povo, daquela vida verdadeira que só Cristo pode abundantemente conceder a todos; em segundo lugar, a reconciliação de todos os dissidentes, separados da Igreja Católica por motivos de fé ou de desobediência, porquanto é indiscutível a vontade do mesmo Jesus Cristo de reuni-los a todos no seu único redil sob um só Pastor. E hoje, pressentindo avizinhar-se o término de nossa vida, experimentamos o mais vivo desejo de recomendar ao Espírito Santo, que é o amor vivificante, todas as realizações empreendidas durante o nosso pontificado, para que ele as faça florescer e frutificar. A fim de que este nosso voto se concretize plenamente, achamos por bem, por ocasião da grande solenidade de Pentecostes, dirigir-vos a palavra sobre a presença e a maravilhosa virtude do Espírito Santo, a saber: a atuação e influência extraordinárias que Ele exerce na Igreja inteira e em cada alma individualmente, mediante a admirável abundância de seus carismas celestes. Almejamos ardentemente, assim, reavivar e fortalecer nas almas a fé no augusto mistério da Santíssima Trindade, e, sobretudo, aumentar e tornar nelas mais fervorosa a devoção para com o Espírito Divino, a quem todos os que trilham os caminhos da verdade e da justiça devem as maiores graças obtidas; pois já o afirmava São Basílio: “Quem negará que os dons dispensados aos homens pelo nosso Deus Altíssimo e por nosso Salvador Jesus Cristo, segundo a bondade divina, sejam um efeito da graça do Espírito Santo?” [2].

II. O MISTÉRIO DA SANTÍSSIMA TRINDADE

3. Antes de tratarmos do assunto proposto, queremos – e será de grande utilidade – dedicar algumas linhas ao mistério da Santíssima Trindade.

Esse mistério é chamado pelos santos doutores de “substância do Novo Testamento”, quer dizer, o máximo entre os mistérios, constituindo a fonte e o fundamento de todos eles. Para conhecê-lo e contemplá-lo foram criados os anjos no céu, e os homens na terra. Permanecendo velado no Antigo Testamento, para que fosse manifestado com maior clareza, o mesmo Deus desceu do meio dos anjos para junto dos homens. “Ninguém jamais viu a Deus. O Filho único, que está no seio do Pai, foi quem o revelou” (Jo 1,18).

Ao escrever, pois, ou falar da Santíssima Trindade, mister é considerar o sábio conselho do Doutor Angélico: “Ao discorrer sobre a Santíssima Trindade, importa proceder com prudência e reserva, porque, conforme diz santo Agostinho, não existe estudo onde o erro seja mais perigoso, as investigações sejam mais penosas, as descobertas sejam mais frutíferas” [3]. O risco que se corre no tocante á fé e ao culto consiste na possibilidade de eliminar a distinção entre as três Pessoas divinas, ou de dividir nelas a sua natureza única; porquanto “a fé católica está em adorarmos a um só Deus na Trindade, e a Trindade na unidade” [Símbolo “Quicumque”; Denz 75].

Por causa disso, recusou terminantemente Inocêncio XII, nosso predecessor, aquiescer aos rogos dos que lhe solicitavam a instituição de uma solenidade especial em honra de Deus Pai. Celebrando-se, pois, em determinadas festas os diversos mistérios do Verbo encarnado, não há, todavia, nenhuma festividade especial unicamente em honra da natureza divina do Verbo. E mesmo as solenidades de Pentecostes não foram antigamente introduzidas para homenagear a Pessoa do Espírito Santo como tal, senão em memória da sua vinda, ou seja, da sua missão exterior.

4. Muita sabedoria presidiu a essas disposições, a fim de que a distinção que se deve fazer entre as Pessoas não resvalasse no erro de diferençar a natureza divina. Além disso, para manter seus filhos na integridade da fé, a Igreja estabeleceu a festa da Santíssima Trindade, que se tornou logo depois obrigatória no mundo inteiro, por ordem de João XXII. Permitiu também que a ela se dedicasse altares e templos. E aprovou, por inspiração do Alto, a Ordem religiosa inteiramente consagrada à Santíssima Trindade e intitulada com seu nome, com a finalidade de libertar os cativos. Para tanto não faltam motivos.

Com efeito, o culto tributado aos habitantes do céu e aos anjos, à Virgem Mãe e a Cristo reverte afinal à mesma Santíssima Trindade. Nas orações dirigidas a uma das Pessoas, mencionam-se igualmente as outras. Nas ladainhas, segue uma invocação comum às invocações endereçadas separadamente a cada uma das Pessoas. Nos salmos e nos hinos, um mesmo louvor é entoado em honra de todas as três Pessoas, Pai, Filho e Espírito Santo. As bênçãos, as cerimônias rituais, os santos sacramentos são acompanhados ou seguidos por uma prece à Santíssima Trindade. Essas preces já há muito tempo nos foram aconselhadas pelo Apóstolo: “Dele e por ele e para ele são todas as coisas. A ele a glória por toda a eternidade!” (Rm 11,36). A primeira parte dessas palavras dá a entender a trindade das Pessoas, e a segunda exprime a unidade da natureza. Sendo esta última uma só e idêntica em cada uma das Pessoas, resulta que a cada uma delas, como a um só e mesmo Deus, deve-se a eterna glória pertinente à divina Majestade. Ao citar esse testemunho, frisa Santo Agostinho: “Não se deve dar um sentido vago às palavras do Apóstolo “Dele e por ele e para ele”; o Apóstolo diz: dele, por causa do Pai; por ele, por causa do Filho; e para Ele, por causa do Espírito Santo” [4].

A. Atribuições

5. É com muita propriedade que a Igreja costuma atribuir ao Pai as obras divinas em que se avantaja o poder, ao Filho, aquelas em que refulge a sabedoria; e, ao Espírito Santo, as demais em que domina o amor. Não que todas essas atividades externas não sejam comuns às Pessoas divinas, pois que “são indispensáveis as obras da Trindade Santíssima, como também lhe é indivisível a natureza” [5], pela razão de as três Pessoas divinas “serem inseparáveis entre si, e, portanto, atuarem conjuntamente” [6]; mas, em vista de certa analogia, ou melhor, afinidade existente entre as mesmas obras e os atributos das Pessoas, somos levados a referir, ou seja, “apropriar” tal e tal obra mais a uma pessoa que a outra. “Empregamos a semelhança de representações ou imagens fornecidas pelas criaturas para figurar as Pessoas divinas e seus atributos essenciais; e esta figura das Pessoas por meio de seus atributos essenciais chama-se apropriação” [7].

Assim Deus Pai, “princípio de toda a divindade” [8], é a causa eficiente da totalidade dos seres, da Encarnação do Verbo e da santificação das almas: “dele é tudo”; dele, por causa do Pai. Deus Filho, porém “Verbo, imagem de Deus”, é a causa exemplar de todas as coisas, que o têm por modelo de suas formas e formosura, de sua ordem e harmonia, a de que se tornou o nosso Caminho, Verdade e Vida, e efetua a reconciliação do homem com Deus: “por ele é tudo”; por ele: por causa do Filho. Enfim, o Espírito Santo constitui a causa final de todos os entes, porque, visto como a vontade e, em geral, as coisas todas repousam na posse do fim almejado, assim o Espírito Santo, que é a bondade divina e o amor recíproco entre o Pai e o Filho, leva à perfeição plena, impelindo, com vigor e doçura, aquelas atuações secretas em ordem à salvação eterna dos homens: “para ele é tudo”; para ele: por causa do Espírito Santo.

B. O Espírito Santo e a Encarnação

6. Resguardando assim, na sua inteireza, o devotamento religioso devido à Santíssima Trindade toda, o qual convém inculcar continuamente sempre mais, no povo cristão, passemos à exposição da Virtude do Espírito Santo.

Antes de mais nada, é mister olharmos para Jesus Cristo, Fundador da Igreja e Redentor da nossa espécie humana. Indubitavelmente, entre as obras exteriores de Deus a que mais sobressai é o mistério do Verbo encarnado, refletindo com tamanho esplendor as perfeições divinas, que nem sequer podemos imaginar esplendor maior, nem outra coisa poderia haver de mais salutar para a natureza humana. Pois esta obra tão relevante, embora realizada pela ação conjunta da Santíssima Trindade, atribui-se particularmente ao Espírito Santo, conforme as palavras do Evangelho referentes á Virgem Santíssima: “Verificou-se ter ela concebido do Espírito Santo” (Mt 1,18.20). Com toda razão é atribuída essa obra àquele que é o Amor do Pai e do Filho, uma vez que tal “sublime mistério da piedade” (1Tm 3,16) procedeu da imensa benevolência de Deus para com os homens, como observa S. João: “Com efeito, de tal modo Deus amou o mundo que lhe deu seu Filho único” (Jo 3,16). Ainda mais, em consequência disso, a natureza humana foi elevada a uma união “pessoal” com o Verbo, dignidade essa que a ela foi concedida de modo nenhum em atenção aos seus merecimentos, mas em total gratuidade e, portanto, por uma graça especial, por assim dizer própria do Espírito Santo. A esse respeito diz com acerto santo Agostinho: “A maneira de Jesus Cristo ser concebido por obra do espírito santo insinua-nos uma tão esplêndida mercê de Deus, pela qual, sem que houvesse quaisquer méritos anteriores, e desde o primeiro instante da existência de sua natureza, o homem foi unido ao Verbo em tão íntima união pessoal que o Filho de Deus fosse o mesmíssimo Filho do homem, e o Filho do homem, o mesmíssimo Filho de Deus” [9].

A atuação do Espírito Santo, contudo, não consistiu apenas em concretizar a concepção de Jesus Cristo, mas também em efetuar a santificação de sua alma, o que os Livros Sagrados denominam “unção” (At 10,37); tanto assim que todas as ações de Cristo “se realizavam sob a direção do Espírito Santo” [10], e principalmente a oblação de si próprio: “Pela virtude do Espírito Santo, ofereceu-se a Deus como vítima sem mancha” (Hb 9,14).

7. Considerando essas verdades, não é de admirar afluíssem à alma de Cristo todos os carismas do Espírito Divino. Residia nele uma singularmente rica abundância de graça, tanto quanto é possível haver em quantidade e eficácia; possuía Ele todos os tesouros da sabedoria e ciência, as graças chamadas gratuitas, as virtudes, em suma: absolutamente todos os dons anunciados nas profecias de Isaías (4,1; 11,2-3), e simbolizados pela maravilhosa aparição da pomba no rio Jordão, cujas almas Cristo santificou por seu batismo a fim de servirem para um novo Sacramento. Cabem aqui, com justeza, as palavras do já citado Santo Agostinho: “É um grande absurdo afirmar que Jesus Cristo recebeu o Espírito Santo só aos trinta anos de sua idade; ele veio ao batismo sem pecado, e, portanto, possuindo o Espírito Santo. Naquela ocasião, pois (a saber, do seu batismo), dignou-se antecipadamente simbolizar seu Corpo que é a Igreja, na qual os batizados recebem o Espírito Santo de maneira inteiramente especial” [11]. À vista disso, o aparecimento manifesto do Espírito Santo sobre Jesus Cristo e a sua operação íntima na alma do Salvador prefiguram a dupla missão do mesmo Espírito: uma visível, na Igreja; a outra invisível, no íntimo das almas dos justos.

III. O ESPÍRITO SANTO E A IGREJA

A. Nos apóstolos, bispos e sacerdotes

8. A Igreja, que já existia em estado embrionário, havendo recebido a existência do lado aberto do segundo Adão, como que dormindo no lenho da cruz, nasceu maravilhosamente para a luz do mundo no tão celebrado dia de Pentecostes. Nesse mesmo dia começou o Espírito Santo a repartir seus benefícios no Corpo Místico de Cristo, com aquela admirável efusão que o profeta Joel previra há tempos (cf. 2,28-29); pois o Paráclito “pairou sobre os apóstolos, para que fossem coroados de novos diademas espirituais, formados por línguas de fogo sobre suas cabeças” [12]. Então, escreve São João Crisóstomo, os apóstolos “desceram do monte, não trazendo nas mãos as tábuas de pedra, como o fez Moisés, mas carregando na alma o Espírito Santo e comunicando-o com profusão aos outros como um grande tesouro e um rio de verdades e de graças” [13].

9. Desse modo se realizou a promessa de Cristo a seus apóstolos sobre o envio do Espírito Santo, que em pessoa, mediante suas inspirações, deveria levar a bom termo a transmissão da doutrina do mesmo Jesus Cristo, e, em certo sentido, selar os seus ensinamentos: “Muita coisa ainda tenho a vos dizer, mas presentemente não o podeis suportar, quando vier o espírito da verdade, porém, ensinar-vos-á toda a verdade” (Jo 16,12-13). De fato, procedendo simultaneamente de Deus Pai, a verdade eterna, e de Deus Filho, a verdade substancial, é Ele o Espírito da verdade, e retira de ambos a natureza que possui e, juntamente com ela, toda a amplitude da verdade. Essa verdade ele a distribui copiosamente à Igreja, velando por ela e assistindo-a com sua presença íntima, para que jamais incorra em qualquer erro, e possa ininterruptamente fecundar sempre em amor abundância os germes da doutrina divina e produzir exuberantes frutos para a a salvação dos povos. E porque a razão de ser da Igreja é a referida salvação dos povos, e esta requer obviamente o ministério da Igreja sem quebra de continuidade, por isso o Espírito Santo proporciona à Igreja uma vida e uma pujança eternas para sua conservação e contínuo crescimento: “Eu rogarei a meu Pai, e ele dar-vos-á outro Paráclito, o Espírito Santo da verdade, para permanecer convosco eternamente” (Jo 14,16-17). É por Ele que são instituídos os bispos, cujo ministério gera não só filhos, mas também pais, a saber, os sacerdotes, para governar a Igreja e alimentá-la do mesmo sangue de Cristo que a reuniu: “O Espírito Santo estabeleceu os Bispos para o governo da Igreja de Deus, que ele adquiriu com o preço do seu sangue” (At 20,28). Uns e outros, porém, os bispos e os sacerdotes, receberam uma graça notável do Espírito Santo, o poder de apagar os pecados, conforme as palavras de Jesus Cristo aos apóstolos: “Recebei o Espírito Santo: aos que perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados, e aquém os retiverdes, ser-lhes-ão retidos” (Jo 20,22-23).

Por fim, para reconhecer a instituição divina da Igreja não há prova mais convincente do que o seu resplendor e glória provindos dos carismas, que o Espírito Santo lhe outorgou em profusão. Baste dizer que, assim como Cristo é a Cabeça da Igreja, assim o Espírito Santo é a sua alma: “O que a alma é em nosso corpo, o mesmo é o Espírito Santo no Corpo de Cristo, a saber, na Igreja” [14].

10. Posto isso, não é absolutamente, admissível excogitar-se ou guardar uma segunda, mais ampla e fecunda “aparição ou revelação do Espírito Divino”; a que atualmente se efetua na Igreja é deveras perfeita, e nela permanecerá incessantemente até que a Igreja militante, após o percurso do seu período de lutas, seja transplantada para as alegrias da Igreja triunfante no céu.

B. O Espírito Santo nas almas dos justos

11. De que maneira e em que medida o Espírito Santo atua nas almas dos fiéis, não é coisa menos estupenda, se bem que mais difícil de compreender, pelo fato de a sua ação ser completamente velada aos nossos olhos.

12. Essa outra efusão do Espírito Santo é também tão abundante, que o próprio Jesus Cristo – pois é de seu dom que ela promana – a compara a um rio caudaloso, como lemos em João: “Quem crê em mim, como diz a Escritura, de seu seio manarão rios de água viva”. O mesmo evangelista acrescenta a interpretação deste testemunho: “Dizia isso, referindo-se ao Espírito que haviam de receber os que cressem nele” (Jo 7,38-39).

Não há dúvida de que o Espírito Santo residiu também nos justos que viveram antes de Cristo, como está escrito dos profetas, de Zacarias, de João Batista, de Simeão, de Santa Ana; pois no Pentecostes desceu o Espírito Santo às almas não “para só desde então habitar a alma dos santos, mas para inundá-la com maior intensidade, para aumentar consideravelmente a distribuição dos seus dons, e não para inicia-la; para multiplicar, portanto, os seus favores com maior liberalidade, e não para começar uma obra nova” [15]. Se aquelas pessoas se contavam no número dos filhos de Deus, não obstante, em razão do que foi exposto, assemelhavam-se, pela sua condição, a servos, pois também o filho “em nada difere do servo”, enquanto permanece “na dependência de tutores e curadores” (Gl4,1-2); pois, além de a justificação lhes ter sido outorgada exclusivamente pelos merecimentos do Cristo vindouro, a comunicação do Espírito Santo efetuada após Cristo foi incomparavelmente mais copiosa, diríamos como o valor de venda de um objeto ultrapassa o do penhor, como a realidade sobrexcede a sua simples imagem. Já o afirmara por isso João: “Ainda não fora doado o Espírito, porque Jesus não fora ainda glorificado” (Jo 7,39). Assim, pois, que Jesus Cristo “ascendendo ao Alto”, tomou posse da glória de seu reino, conquistada à custa de tantos padecimentos, descerrou com munificência os tesouros do Espírito Santo, “concedeu os seus dons aos homens” (Ef 4,8). Porquanto “esta doação ou missão do Espírito Santo depois da glorificação de Cristo haveria de ser tal como antes nunca houve; missões do Espírito Santo já haviam ocorrido, jamais porém de modo tão excepcional” [16]. De fato, é a natureza humana necessariamente serva de Deus: “A criatura é serva e nós somos servos de Deus pela natureza” [17]; e mais, por causa da mancha comum, nossa natureza inteira decaiu a tão grande abismo de vício e infâmia que nos tornamos inimigos de Deus: “Éramos pela natureza filhos da ira” (Ef 2,3). Nenhum poder, por maior que fosse, nos poderia libertar de tamanha ruína e da perdição eterna. Mas Deus, Criador da natureza do homem, efetuou-o na sua imensa misericórdia por meio de seu Filho unigênito: por sua graça foi o homem reabilitado na sua antiga dignidade e nobreza, adornado dos mais ricos dons. Ninguém pode descrever qual seja esta obra da graça divina nas almas dos homens; pelo que as Sagradas Escrituras e os Padres da Igreja chamam a estes últimos, com boa razão: renascidos, criaturas novas, participantes da natureza divina, Filhos de Deus, divinizados, e outros títulos análogos.

13. Ora, não é sem motivos que esses tão largos benefícios são atribuídos ao Espírito Divino. É Ele “o Espírito da filiação adotiva, que nos faz exclamar: Abba, Pai!” Também é ele quem deleita os corações com as doçuras de seu amor paternal: “Este mesmo Espírito revela ao nosso espírito que somos Filhos de Deus” (Rm 8,15-16). Para explicar isso mais claramente, cabe lembrar aqui muito a propósito, a semelhança, percebida pelo Doutor Angélico, entre as seguintes duas obras do Espírito Santo: por Ele “Jesus Cristo foi concebido em santidade para ser o Filho natural de Deus”, e por Ele também “os homens são santificados para se tornarem Filhos adotivos de Deus” [18]. Assim, o amor, isto é, o Amor incriado, realiza uma regeneração espiritual bem mais superior à que se processa na natureza.

C. Nos sacramentos

14. Essa regeneração ou renovação começa para o homem pelo batismo; nesse sacramento é expelido da alma o espírito imundo, e nela penetra pela primeira vez o Espírito Santo, que a torna semelhante a si: “O que nasceu do Espírito é espírito” (Jo 3,7). Doa-se a ela ainda, em grau mais perfeito, para lhe outorgar a fortaleza e o vigor da vida cristã, no sacramento da Confirmação; por ele é que os mártires e as virgens triunfaram dos atrativos da corrupção. Como dissemos, é o próprio Espírito Santo que se dá: “O amor de Deus foi derramado em nosso coração pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,5). Pois não só nos proporciona as graças divinas, mas é também o seu autor. Ele próprio é a dádiva suprema; procedendo do amor recíproco do Pai e do Filho, com justeza é considerado e denominado “o dom de Deus altíssimo”.

15.  Para lançar mais luz sobre a natureza e a virtude desse dom, é necessário recordar as explicações dadas pelos santos doutores aos ensinamentos das Sagradas Escrituras, isto é, que Deus está presente e dentro de todas as coisas “por seu poder, enquanto tudo está sujeito à sua potestade; por sua presença, enquanto tudo está descoberto a seus olhos; por sua excelência, enquanto é a causa da existência de todos os seres” [19]. No homem, porém, Deus está presente não apenas como nas coisas; mais que isso, é por Ele conhecido e amado, pois a mesma natureza nos impele a que espontaneamente amemos, cobicemos e procuremos alcançar o bem. Enfim, Deus, pela sua graça, reside na alma do justo como em templo, de maneira completamente íntima e singular, daí os fortes liames de caridade que estritissimamente unem a alma a Deus, sobrepujando a amizade do amigo ao melhor dos amigos, e a fazem gozá-lo em delícias inexcedíveis.

D. Na inabitação

16. Essa admirável união, denominada “inabitação”, não difere, a não ser por sua condição ou estado, daquela que possuem os habitantes do céu na posse beatífica de Deus; e, não obstante seja um efeito realíssimo de toda a Trindade divina: “Viremos a ele e faremos nele nossa habitação” (Jo 14,23), é, contundo, considerada obra peculiar do Espírito Santo. Porquanto também no homem perverso podemos deparar reflexos do poder e sabedoria de Deus; mas só o justo participa do amor divino, característica do Espírito Santo. Condiz também com essa verdade o fato de o Espírito Santo ser chamado Santo, e isso porque é Ele, primeiro e sumo Amor, quem conduz e impulsiona as almas à santidade, a qual, em última análise, consiste no amor de Deus. Eis a razão por que o Apóstolo, ao intitular os justos templo de Deus, não os chama expressamente de tempos de Deus Pai ou de Deus Filho, mas sim do Espírito Santo: “Não sabeis acasos que o vosso corpo é templo do Espírito Santo, que habita em vós e que recebestes de Deus?” (1Cor 6,19).

17.  De vários modos se patenteia a abundância dos bens celestes resultantes da presença do Espírito Santo nas almas piedosas. Não é outra a doutrina do Aquinate: “Uma vez que o Espírito Santo procede como amor, procede na qualidade de primeiro dom; por isso diz Santo Agostinho que, pelo dom que é o Espírito Santo, vários dons particulares são distribuídos aos membros de Cristo” [20]. Entre essas graças estão as tais secretas exortações e misteriosos convites que, por impulso do Espírito Santo, amiúde surgem na inteligência e no coração, e sem os quais é impossível enveredar pelo bom caminho, progredir, e enfim conseguir a salvação eterna. E porque as ditas vozes e moções se realizam na alma de modo absolutamente secreto, com muito acerto a Escritura Sagrada as compara algumas vezes ao sopro da brisa; e o Doutor Angélico assemelha-as habilmente às pulsações do coração, cuja força toda se oculta inteiramente dentro do ser animado: “O coração possui certa influência escondida, e por esse motivo a ele se compara o Espírito Santo, que invisivelmente dá vida e unidade à Igreja” [21].

E. Nos sete dons e nos frutos

18. Além do que se disse, o justo, isto é, o que vive a vida da graça divina, aperfeiçoando-se pelo exercício de virtudes congruentes como hábitos adquiridos, tem inegável necessidade dos setes dons que são os propriamente ditos dons do Espírito Santo. Pois eles fornecem à alma aptidão e força, para mais fácil e prontamente obedecer à voz e ao incitamento do Espírito Divino; possuem ademais tanta eficácia, que conduzem o homem ao mais alto grau de santidade, e são tão excelentes que permanecem os mesmos no reino celeste, embora mais perfeitos. Graças a esses carismas, a alma se sente aliciada e estimulada a se empenhar em conseguir as bem-aventuranças evangélicas que, quais flores desabrochadas em plena primavera, prenunciam a bem-aventurança eternamente duradoura. Por fim amadurecem aqueles frutos ditosos que o Apóstolo enumera um por um (Gl 5,22) e que o Espírito Santo produz e proporciona aos justos mesmo nesta vida perecível, frutos sobremaneira doces e deleitosos, tais como só podiam provir do Espírito “que na Santíssima Trindade constitui a suavidade do Pai e do Filho, e a todas as criaturas prodigaliza suas generosas e fecundas dádivas” [22].

19. Resumindo: o Espírito Santo procede de Deus Pai e do Verbo na eterna luz da Santidade, é simultaneamente amor e dom, e, havendo-se revelado no Antigo Testamento sob o véu de figuras, derramou-se todo em Cristo e no seu Corpo Místico, que é a Igreja; e aos homens, submersos nos seus vícios e na corrupção, reconduziu-os tão salutarmente pela sua presença e graça que, já não parecendo seres terrestres vindo da terra, adquirem bem outros gostos e aspirações, como se fossem habitantes do céu dele descidos.

IV – EXORTAÇÕES

A. À devoção ao Espírito Santo

20. À vista dessas verdades tão sublimes, que por demais claramente nos manifestam a imensa bondade do Espírito Santo para conosco, sentimo-nos constrangidos por elas a lhe testemunhar todo o nosso afeto e piedade filial. O que os cristãos podem conseguir plenamente, envidando cada dia maior diligência em o conhecer, amar e invocar; para que assim procedam, endereçamos-lhe a seguinte exortação, que irrompe espontânea de nosso coração paternal.

21. Talvez até hoje em dia existam ainda cristãos que, interrogados se receberam o Espírito Santo, respondam no mesmo teor daqueles a quem São Paulo Apóstolo dirigiu qual pergunta, e digam como eles: “Mas se nem ouvimos dizer que existe um Espírito Santo!” (At 19,2). Muitos, se não chegam a tanto, é certo que têm do Divino Espírito apenas conhecimentos muitíssimos rudimentares; nomeiam-no com frequência nos seus exercícios de piedade, mas com aquela confusa fé imersa em densa escuridão. Em face desse estado de coisa, lembrem-se todos os pregadores e todos os pastores e diretores de almas que lhes incumbe a obrigação de instruir o povo, como maior desvelo e mais circunstancialmente, sobre tudo o que concerne ao Espírito Santo,  evitando, todavia, discorrer sobre as árduas e sutis questões controvertidas, como também fugindo da vã e insensata temeridade dos que pretendem penetrar todos os mistérios divinos sem exceção. Deverão principalmente recordar e expor com clareza os numerosos e inefáveis benefícios que recebemos e continuamos a receber deste doador divino, para que desapareçam de vez tanto o erro como a ignorância a respeito de tão altas verdades, ignorância que seria indigna dos “filhos da luz”.

Insistimos nesse ponto, não só por se tratar de um mistério que diretamente nos conduz á vida eterna, logo mistério de fé, mas também pelo fato de se amar mais ardentemente o bem quanto mais perfeito for o seu conhecimento.

22. Pois – passando ao segundo ponto de nossa exortação – ao Espírito Santo se deve amor, porquanto é Deus: “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e com todas as tuas forças” (Dt 6,5). Deve Ele ainda ser amado, por ser o Amor substancial, o Amor eterno, o primeiro Amor, e nada há de mais amável do que o amor, e os motivos para O amarmos avultam grandemente por nos ter Ele cumulado das maiores mercês, que ao mesmo tempo testemunham sua benevolência para conosco e provocam nossa gratidão para com Ele. O amor que Lhe devotamos traz-nos vantagens muito apreciáveis: primeiro, estimula-nos a aprimorar sempre mais os nossos conhecimentos sobre a sua Pessoa, como no-lo ensina o Doutor Angélico: “Aquele que ama não se satisfaz com uma apreensão imperfeita do ente amado, antes empenha-se para lhe esquadrinhar todas e quaisquer qualidades interiores, e desse modo lhe penetra no íntimo, como se diz do Espírito Santo, o Amor de Deus, que perscruta até os mistérios profundos da Divindade” [23]; em segundo lugar, há de nos granjear maior abundância de favores celestes, porque, se é verdade que a ingratidão fecha a mão do benfeitor, o reconhecimento ao contrário abre-a amplamente. Há de se cuidar, porém, diligentemente que tal amor não se limite a umas áridas noções teóricas e a uma homenagem puramente exterior, mas que se distinga pela pronta ação, principalmente pela fuga do pecado, o qual de modo muito particular ofende ao Espírito Santo. Com efeito, tudo o que somos, devemo-lo à divina bondade, atribuída que é preponderantemente ao mesmo Espírito: a este benigno benfeitor injuria aquele que peca, que, abusando de suas dádivas e de sua bondade, torna-se dia a dia mais insolente.

B. Não O ofendamos

23. Quanto a isso um reparo: visto que o Espírito Santo é o Espírito da verdade, se alguém se tornar culpado por fraqueza ou ignorância, poderá talvez ter algum motivo que o escuse aos olhos de Deus; mas o que por malícia resiste à verdade e lhe volve as costas, comete um gravíssimo pecado contra o Espírito Santo. Esse pecado assumiu tais proporções na presente época, que parecem chegados aqueles perversos tempos anunciados por Paulo, nos quais os homens, obcecados por uma sentença muito justa de Deus, tomarão por verdadeiro o que é falso e darão crédito ao “príncipe deste mundo”, que é mentiroso e o pai da mentira, como se fosse mestre da verdade: “Enviar-lhe-á Deus a sedução do erro a fim de que deem fé à mentira” (2Ts 2,10). “Nos últimos tempos, uns quantos hão de apostatar da fé, dando ouvidos aos espíritos do erro e à doutrina dos demônios” (2Tm 4,1).

24. Habitando, pois, como acima referimos, o Espírito Santo em nós como se residisse em seu templo, importa refletir no preceito do Apóstolo: “Não sabei porventura que sois templo de Deus, e que o Espírito de Deus habita em vós? Se algum, a despeito disso, profanar o templo de Deus, Deus o destruirá; porque o templo de Deus é santo, e esse templo sois vós” (1Cor 3,16-17): terríveis ameaças, justíssimas, porém!

C. Peçamos ao Espírito Santo

25. Afinal, é preciso dirigir fervorosas súplicas ao Espírito Santo, visto que em absoluto ninguém há que não tenha a maior necessidade de sua proteção e de seus auxílios. Uma vez que todos carecemos de conselho, faltas de forças, oprimidos de desgostos, propensos no mal, devemo-nos socorrer daquele que é a fonte perene de luz, fortaleza, consolação e santidade. Dele precipuamente devemos rogar aquela graça indispensável aos homens, o perdão dos pecados: “É próprio do Espírito Santo, ser ele o dom do Pai e do Filho; e o perdão dos pecados é o Espírito Santo que o realiza, enquanto é dom de Deus” [24]. É desse Espírito que a liturgia diz em termos mais expressos: “Ele é a remissão de todos os pecados” [25].

26. A maneira de invocá-lo nos é otimamente transmitida pela Igreja, ao suplicá-lo e conjurá-lo com instância e pelos nomes mais doces: “Vinde, ó Pai dos pobres. Vinde, doador das graças; vinde, ó luz dos corações; ó consolador supremo, amável hóspede da alma, doce refrigério”. E implora-lhe, com todas as veras, que purifique, saneie, orvalhe os espíritos e os corações, e dê aos seus devotos “o mérito da virtude, uma morte feliz, eterna alegria” [26]. De forma alguma poderia alguém duvidar de que ele deixe de atender a essas preces, já que temos o testemunho escrito de sua autoria: “o próprio Espírito intercede por nós com gemidos inefáveis que não se podem interpretar por palavras” (Rm 8,26). Enfim, peçamos-lhe assiduamente e com toda a confiança que sempre mais nos ilumine com a sua luz e nos incendeie o coração nas chamas de seu amor, a fim de que, sustentados pela fé e caridade, marchemos com ardor em busca de recompensas eternas, pois ele “é o penhor da nossa herança” (Ef 1,14).

D. Novena do Espírito Santo

27. Aí tendes, veneráveis irmãos, as nossas advertências e admoestações que houvemos por bem publicar para incrementar o culto do Espírito Santo. Não temos a menor dúvida de que elas, com o vigoroso e pronto auxílio de vosso zelo, produzirão frutos abundantes entre o povo cristão. Visando a tão importante escopo, jamais pouparemos os nossos esforços neste sentido, e tencionamos fomentar e propagar esta piedade tão excelente, pelos meios que, com o correr do tempo, parecerem mais adequados. Como há dois anos, pela nossa carta “Provida matris” [27] recomendamos preces especiais, a se realizarem por ocasião das festividades católicas de Pentecostes, para que Deus nos apresse o benefício da união da cristandade, resolvemos agora a esse respeito baixar algumas decisões mais amplas. Decretamos, portanto, e ordenamos que, em todo o orbe católico, no corrente ano e em todos os anos subsequentes, seja celebrada uma novena pública antes de Pentecostes em todas as igrejas paroquiais, e, caso os respectivos Ordinários julgarem útil, também nas outras igrejas ou capelas.

A todos, porém, que assistirem a essa novena e orarem devotamente em nossa intenção, concedemos para cada dia uma indulgência de sete anos e sete quarentenas junto a Deus; e uma indulgência plenária num dia qualquer dos mencionados, ou na festa mesma de Pentecostes, ou ainda em qualquer dia dos oito seguintes, sob a condição de terem recebido devidamente os sacramentos da penitência e da sagrada comunhão e orarem com devoção segundo a nossa referida intenção. Desses benefícios queremos que gozem de igual modo os que por motivo legítimo estão impedidos de participar dessas preces públicas, ou que residem onde, a juízo do Ordinário, elas não se podem realizar sem grande incômodo; contanto que façam, porém, a novena em particular e cumpram as demais condições. Além disso, decidimos dar do tesouro da Igreja para todo o sempre a seguinte graça: todos os que, em público ou em particular, fizerem igualmente cada dia, durante a oitava de Pentecostes até á festa da Santíssima Trindade, inclusive, algumas orações ao Espírito Santo, conforme a sua piedade lhes sugerir, e executarem retamente as outras condições supracitadas podem lucrar pela segunda vez ambas as indulgências. Outrossim concedemos misericordiosamente no Senhor que todas essas graças e indulgências possam ser aplicadas em sufrágio das pias almas sentenciadas ao fogo do purgatório.

E. O Espírito Santo e a Virgem Maria

28. Neste momento nosso espírito e nossa atenção se voltam aos votos que expressamos no começo, cuja concretização ardentemente imploramos ao Espírito Santo e não cessaremos de o fazer. Ó veneráveis Irmãos, uni as nossas preces às vossas, e ao vosso apelo todos os povos juntem as suas, socorrendo-se todos da intervenção da Virgem Santíssima, Mediadora poderosa e gratíssima aos olhos de Deus. Conheceis de sobejo suas relações íntimas e maravilhosas com o Espírito Santo, razão muito justa dela se chamar sua Esposa Imaculada. As súplicas desta Virgem, com efeito, muito contribuíram tanto para se realizar o mistério da Encarnação, como para que descesse o referido Paráclito na assembleia dos apóstolos. Que ela, portanto, mediante a sua intercessão continue, na sua imensa bondade, a sufragar o nosso pedido coletivo, para que, em todas as nações, tão desgraçadamente atribuladas, o Divino Espírito restabeleça generoso aquelas maravilhas divinas, celebradas no vaticínio de Davi: “Enviai o vosso Espírito e tudo será criado, e renovareis a face da terra” (Sl 103,30).

Como auspício das dádivas celestes e em testemunho de nossa benevolência, damos a vós, veneráveis irmãos, ao vosso clero e povo, muito afetuosamente no Senhor, a nossa benção apostólica.

Roma, junto a São Pedro, 9 de maio de 1897, XX ano do nosso pontificado.

LEÃO PP. XIII


Notas

  1. S. Leão Magno., Sermo II, no aniversário de sua elevação ao Pontificado.
  2. Sobre o Espírito Santo, c. XVI, n. 39.
  3. Summa Theol., I, q. 31, a. 2; De Trinitate, l. I, c. 3.
  4. De Trinitate, l. VI, c. 10, I. I, c. 6.
  5. De Trinitate, l. I, c. 5.
  6. De Trinitate, l. I, c. 4.
  7. S. Tomás, Summa Theol., I, q. 39, a. 7.
  8. S. Agostinho, De Trinitate, l. IV, c. 20.
  9. S. Agostinho, Enchiridion, c. 40; S. Tomás, Summa Theol., III, q. 32, a. 1.
  10. S. Basílio, De Spiritu Sancto, c. XVI.
  11. S. Agostinho, De Trinitate, l. XV, c. 26.
  12. S. Cirilo de Jerusalém, Catequese, 17.
  13. S. João Crisóstomo, In Matth, hom. 1; cf. 2Cor 3,3.
  14. S. Agostinho, Sermo 187 de temp.; Sermo 267 in die Pentec., c. 4, n. 4.
  15. S. Leão Magno, Hom. III, de Pentec., Sermo 77, 1.
  16. S. Agostinho, De Trinitate, l. IV, c. 20.
  17. S. Cirilo de Alexandria, Thesaurus, l. V, c. 5.
  18. S. Tomás, Summa Theol., III, q. 32, a. 1.
  19. S. Tomás. Summa Theol., I, q. 8, a. 3.
  20. Summa Theol., I, q. 38, a. 2; S. Agostinho, De Trinitate, I, XV, c. 19.
  21. Summa Theol., III, q. 8, a. 1 ad 3.
  22. S. Agostinho, De Trinitate, l. VI, c. 10.
  23. Cf. 1Cor 2, 10; S. Tomás, Summa Theol., I-II, q. 28, a. 2.
  24. S. Tomás, Summa Theol., III, q. 3, a. 8 ad 3.
  25. Missal Rom., terça-feira depois de Pentecostes.
  26. Missal Rom., Dom. de Pentecostes, Sequência “Veni Sancte Spiritus”.
  27. Cf. Leão XIII, Carta apostólica Provida Matris, 5 de maio de 1895.

Transcrito do livro “Documentos de Leão XIII”, Coleção Documentos da Igreja, da Editora Paulus.